terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Primeira parte de: Epitáfios

Por alguma razão, eu vim. Por outra, parti.

Naqueles instantes que antecederiam ao fim, comecei a me lembrar do começo. Acho que é sempre assim, parecemos velhinhos ao lembrar as coisas que os anos apagaram. Lembrei-me da infância, da inocência, de alguns amigos e paqueras, lembrei-me da minha primeira escola, da nossa mudança de cidade. Lembrei-me dos móveis da nova casa, da nova escola, da falta de amigos, do cachorro que compramos para que eu não me sentisse tão só - chamava-se "Bin", como num filme que eu havia visto.
Ainda que algumas lembranças fossem como papel velho ou queimado, fui assistindo a minha vida. Meus primeiros anos no colegial, meus namoradinhos, meus amigos, meus professores, meus vizinhos, as festinhas, os aniversários, os presentes, os lançamentos, as músicas. Parecia tudo tão próximo de repente, como se nunca houvessem deixado de estar comigo. Talvez eu que não os notasse. Cada lembrança me fazia mais interessada naquela nostalgia. Minha primeira vez, minha primeira aliança, minha faculdade, minhas dúvidas, meu primeiro apartamento, meu carro, minhas viagens. Roberto, Paulo, Cristiano, Henrique, Júlio, Nicolas. Tantos homens que passaram, alguns marcaram. Meu primeiro emprego, o segundo, o terceiro, o quarto, o quinto...
Ainda que fosse tarde demais eu percebi que de nada me arrependia. Se fosse para fazer de novo, talvez fizesse algumas mudanças, mas dor, desespero, não, nada disso existia. Estava tudo como deveria estar. Apesar de muitos não entenderem, assim é a vida, cheia de alegrias e tristezas, mas vivida.
Comecei a pensar no motivo. Por que eu estava ali? Por que aquela decisão? A princípio não encontrei uma resposta, mais uma frustração. Logo descobri. Não partiria por desprezo, tristeza, raiva, solidão, incerteza, afinal são sentimentos ruins e, passageiros. Se eu quisesse um motivo precisaria ser poético, puro, honesto, inexorável. Nada como o tempo para achá-lo: o ciclo fora concluído.
Eu já aprendi muito, também ensinei. Já consegui dinheiro e o gastei. Já conheci lugares, fiz aventuras, realizei sonhos, conclui projetos. Só não formei família, mas não acredito nisso, acho que é um costume popular, se o fizesse não poderia encerrar o ciclo.
Agora eu parto de coração aberto, de mente iluminada e limpa.

Inverno, 2008.

-> Revisado em 4 de julho de 2010.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Amor poético - Ana Kita

Inverno, 2008 - Joinville

Tudo começou com aquele casual encontro de biblioteca, conversamos normalmente como dois jovens desimpedidos que éramos. Não falamos de namoro, nem de sexo, de família, universidade ou trabalho, sei lá, só falamos. Foi a conversa da minha vida. O encontro perfeito, o papo ideal, aparência de chamar atenção, um lugar bonito, uma data comum... Não marcamos para nos reencontrar, mas nos vimos de novo.
Uma, duas, três, quatro vezes talvez. Passeamos de ônibus uma vez, duas voltas completas, dessa vez só ele falou. Ensinou-me coisas incríveis, sobre o mundo, sobre mim. Vocabulário.... Um dia fomos a minha casa, deitamos lado a lado, discutimos um pouco, opiniões opostas, foi salutar a final. Passeamos até um café, não ficamos muito porque havia muita gente e consequentemente muito barulho. Ambos detestavam agito. Passamos um final de semana na praia, pegamos sol, ficamos na rede... Foram excelentes encontros. Confesso.
Pena que como quase tudo na vida, um dia chegou nosso fim, levei-o até a biblioteca, poderíamos nos ver novamente, mas era o fim de um ciclo, não havia mais razão. Pelo menos nessa fase da minha vida: havia terminado. Fomos até a estante em que nos conhecemos, e lá nos despedimos. Não recordo mais seu nome, talvez seja este o único motivo que não me faça voltar a sair com aquele maravilhoso e inesquecível livro.

-> Revisado em 2 de julho de 2010.