sexta-feira, 29 de abril de 2011

Quanto ao andar e aos olhares

Eu andava, e sempre olhava ao redor. Sentia medo dos olhares, pareciam me invadir. E com meu olhar os admirava. A todos, sempre tão felizes, tão completos. Tinha medo, e não entendia.
Um dia, fiquei completa, perdi o medo. Esqueci de olhar e viver tornou-se mais importante. Sinto-me ainda mais olhada, e alegro-me. Sorrio, também no propósito de mostrar a todos que é possível ser feliz, e completo. Percebo que a maioria não é feliz, quem dirá acredita que pode ser. Eu digo que sim, demonstro, e vivo. Olho pra dentro de mim, e andamos.

Ana Kita

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Carta ao pai 18: Amor e namorado

Joinville, 25 de abril de 2011.

   Pai, ontem vivi o que você e eu mais desejávamos, sem que um revelasse ao outro. Apresentei meu namorado à nossa família. Tão engraçado agora olhar para trás e ver o quanto ansiei por isso. Sinto muito que eu não possa ter visto seus olhos ou seu sorriso, mas, pai, senti sua aprovação através dos demais sorrisos. Parece que assim como meu namorado gostou da nossa família, meus irmãos, a mãe e o tio aprovaram minha escolha. Mas, no amor, nós, românticos, sabemos que não há escolha. E essa é uma das únicas faltas de escolha a qual nos rendemos felizes. Estou muito feliz, pai. "Queria até que pudesses me ver"
   Conversamos, rimos, jogamos (Jogo da Vida, com o qual presenteei meu maninho pelo aniversário - 8 anos já, pai), torcemos pelo JEC (decepcionamo-nos com a derrota), acompanhamos o final do jogo Flamengo e Fluminense (pois é, seu genro tem esse defeitinho, é flamenguista, mas meu coração é dele, bem como do nosso Vasco), e o Flamengo ganhou (nos penaltis), vai jogar contra o Vasco na decisão da Taça Rio. Enfim, as ações, em comparação, tiveram pouca importância. O que me importava era estar com nossa família e com meu namorado, ou seja, com aqueles que amo e me amam, num divertido domingo de Páscoa.
   Pai, não vou dizer que não senti sua falta, seria mentira. Senti-a e muito forte, mas não daquele jeito triste, como quem sofre por não entender. Foi de um jeito alegre, um jeito de quem queria compartilhar sua felicidade, seu amor. Amo tanto, pai. Amo meu namorado de uma forma que nem acreditava ser possível, amo a mim mesma, amo nossa família, e eu o amo, pai. Eu sempre o amarei. Eu o amo pela família linda que me deu, pela pessoa que sou, pelas lembranças que tenho, pela força que me dá pensar em você, por suas características que encontro em meu namorado... A mãe disse que você iria gostar dele, que ficaria feliz, também acho isso. Torça por mim, pai, porque encontrei minha felicidade e farei de tudo para nunca mais me desencontrar dela.

Escrevo-lhe mais, logo mais.
De todo coração,
sua primogênita, Ana.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Todo o tempo - Ana Kita

   O passado se desfazia quando se olhavam. Ela lembrava, usava do que viviam, e comentava. Ele não ouvia, não queria, não pensava. E se beijavam, faziam lembranças, eram passado e presente de ambos. Queriam ser futuro, e seriam.

Ana Kita

sexta-feira, 15 de abril de 2011

As histórias de Vovô - Ana Kita

   Na noite anterior, Vovô me contou algumas histórias de que Vovó reclama, as da guerra. Prometemos guardar segredo, afinal Vovó e Mamãe não entendem nossa paixão por História. As histórias de Vovô, contadas pelo pai dele, que viveu na guerra, fazem parte da minha herança, quero conhecê-las todas, são demais. Desta vez, Vovô estava sentimental, até contou de batalhas, mas dizia de "ciscos" nos olhos dos soldados ao encontrarem adolescentes entre os atingidos, e terminou falando que os soldados usavam as noites sem combate para olhar as estrelas e orarem por suas famílias. Senti um arrepio. Fiquei imaginando o quanto as estrelas ouvem sobre o amor e a saudade.
   De manhã, pedi ajuda a Mamãe para encontrar dados da guerra na Rússia, queria saber dados mais "certos". Confio no Vovô, mas aprendi na escola que as informações passadas de "boca-em-boca" vão se alterando com o tempo. Mamãe não gostou muito, mas até me ajudou. Um dia desses, no jornal, ela ouviu uma psicóloga falando que é importante responder às crianças, mesmo quando se acha que "não deviam saber". Acho que mexeu com ela. Eu estava super empolgado com os números, milhares de guerreiros, milhares de mortos, quilômetros e quilômetros invadidos e centenas de cidades abandonadas, quando o telefone tocou e Mamãe ficou pálida. Ela desligou o telefone e eu continuei falando, mas ela já não me ouvia. Então, ela me abraçou com aquele olhar de adulto que não sabe o que falar e chorou. Eu fiquei preocupado, disse que a amava, algumas vezes ajuda, mas dessa vez parece que piorou.
   Ficamos em silêncio uns minutos, que me pareceram enormes, até ela me soltar, sentar do meu lado e escolhendo as palavras a dizer: Meu amor, o Vovô está no hospital. Perguntei o que ele tinha e ela não me respondeu, ficou naquela de amenizar tudo e disse apenas: Não é nada grave, se Deus quiser amanhã ele volta para casa. Não acreditei muito, mas segui o conselho dela de ir ao meu quarto e escrever uma cartinha pra ele (ela entregaria à tarde, quando eu estivesse na escola, e ela fosse visitá-lo). Fiquei pensando naquilo que Mamãe disse, os adultos sempre dizem, mas pra mim não parece fazer sentido: "se Deus quiser". Não que Deus não queira, mas não é uma questão dos médicos trabalharem direito? Do remédio fazer efeito? Do Vovô ficar bom? Não sei bem como Deus pode fazer o Vovô voltar amanhã ou só depois. Sei que não é hora de perguntar, Mamãe choraria e iria explicar mil coisas sem me responder realmente.
   Na carta escrevi que à noite eu olharia as estrelas e pediria a Deus que ele voltasse logo pra casa. Prometi que dormiria cedo, mesmo que a Vovó não fosse substituí-lo com as histórias. Terminei dizendo que o amava muito e que era só convencer a Mamãe a me levar no hospital, se ele quisesse minha companhia. Ano passado fiquei uma semana no hospital e sei como podem ser chatos.

Ana Kita

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Primeiro mês - Ana Kita

   1 mês. Uma história, o começo dela. Um amor, O amor. Já não há palavras que superem o que sinto, o quão feliz sou, o quanto completa me sinto. Mas, eu tento. Insisto. E não desisto, jamais. Creio em mais, e sinto-me boba. Acho que é normal, sempre assim, trata-se de amor. O mais puro, verdadeiro e forte amor. Aquilo com que se sonha uma vida toda e se entende ao sentir, ao tremer, ao beijar. E beijo, tremo, sinto. Amo muito. Primeiro mês de muitos de amor.

Ana Kita

terça-feira, 12 de abril de 2011

A namorada - Ana Kita

"Eu te amo e vou gritar pra todo mundo ouvir..." [Roupa Nova]

   Esperei como quem precisa correr até lá e sabe que encontrará muito do que procurava. Encontrei mais. A lua radiante, o céu estrelado, seu corpo junto ao meu, e as peças se encaixando. A curiosidade foi sumindo e a felicidade se fez plena. Esperei tanto por isso e hoje vejo que o momento certo chegou. Não podia ser antes, tinha hora, local e personagens, tudo num roteiro perfeito há muito tempo. Pode ser só mais um sonho, mas se eu vivê-lo intensamente sei o quão significante poderá ser. E vivo. Porque meu corpo pulsa por ele, porque minha alma transpira isso. Porque é real. 
   Sempre achei que um pedido pudesse mudar tudo, por isso temia, desde que virou febre na sétima série. Minhas amigas aderiram e eu, apenas, assisti de camarote. Ainda como menina sonhadora ficava esperando quando chegaria minha vez, por vezes desisti, não da felicidade, da formalidade. Sentir por si só já me era o bastante. Hoje pareço entender o porquê. Não se tratava de puro título desnecessário, exigia um transbordamento de reciprocidade que eu nunca havia vivido. Não vou mentir que a espera não foi tensa, mas a recompensa valeu cada segundo. 
   Minha vontade é gritar pra todo mundo, anunciar no rádio e escrever com as nuvens. Publicar minha felicidade, mostrá-la a todo mundo como que a provar que esperança vale a pena. Explicar a todos que se eu estive certa no tempo em que pensava andar fazendo tudo errado: tudo bem, porque um dia chega alguém que é capaz de contornar nossos erros e nos amar também por eles. Passei algumas horas pensando na melhor forma de tocar a todos com meu grito, mas na hora de dormir entendi que ninguém poderá sentir toda minha felicidade. Não importa o quanto eu grite, nem as palavras que eu buscar, não importa a mais bela imagem com que eu decore ou quantas vezes eu repita. A felicidade do amor só existe para quem o vive. Eu vivo e isso me (e àqueles que me querem bem) basta. 

Ana Kita

domingo, 10 de abril de 2011

Carta a ti: que quero revelar

Joinville, 10 de abril de 2011.

   Sempre fui de me revelar, como um livro aberto, jorrando meus sentimentos a todos, mesmo que alguns preferissem nem me ler. Um dia acreditei ter aprendido que isso não era o certo, que era preciso esconder, revelar-se aos poucos, deixar sub-entendido, guardar para si. Ainda não sei. O que vejo hoje e todos os momentos em que olho em seus olhos é que mesmo sem palavras já me revelo. Pode me ler ou não, mas estou aqui, como que completamente tatuada por três palavras. São puras, verdadeiras e hoje ditas sem medo. Uma delas se sobressai, e as outras se unem por ela.
   Sujeito simples, verbo transitivo direto e objeto direto. Mesmo eu que adoro tanto a sintaxe acho que nesta frase ela é pouco relevante, tem razão sobre haver transitividade nessa ação e ser bastante direta, no entanto, não é simples, nem tudo isso parece dizer o suficiente. Pronome pessoal do caso reto, verbo conjugado na primeira pessoa do singular no presente do modo indicativo e pronome de tratamento. A morfologia parece falhar ainda mais, é sim presente e indica muita coisa, mas não é um caso tão reto nem só de tratamento, tampouco singular. Eu diria ser um círculo, com toda perfeição e infinidade da forma. Prefiro não dizer nada, é um período verbal, serve para ser vivido. E vivo (vivemos).
   Desculpe se me empolguei na gramática, saiba que nada disso importa quando a frase é real. E é. Vejo minha frase como uma avenida de mão dupla, com ela vou a você e nela você chega. Se passamos a usá-la com frequência ou começarmos a usá-la sempre, não se preocupe. Dizer demais não significa perder a importância, só pensa assim quem não conhece seu verdadeiro sentido. Ela precisa ser sentida antes de dita, a facilidade de pronunciá-la não está na simplicidade das sílabas, mas na verdade do sentimento. Ontem, mais do nunca, entendi a complexidade de dizê-la, de senti-la e permitir que ela transborde. Eu focava na palavra do meio, achava ela a mais complexa e agora entendo que não. Sem a complexidade das demais ela fica nula.
   A primeira eu conheço de longa data, nunca acreditei que fosse simples. A última estou conhecendo, dei um passo gigante ontem, e sei que todos os dias caminharei para tentar revelar sua complexidade. Quase que inutilmente, considerando que cada palavra e elas juntas nunca serão reveladas por inteiro (até porque estão sempre crescendo e mudando), o encantamento está justamente em senti-las e conhecê-las plenamente, embora nunca por completo. Contudo, não é inútil, essa é caminhada que faz a vida valer a pena, a razão de acordar e dormir todos os dias. Agradeço muito que esteja comigo. Eu amo você!

Com amor, sua Ana.

sábado, 9 de abril de 2011

Um grande dia - Ana Kita

   Toda realização de um sonho deve ser assim: um sonho fortificado pela espera, amadurecido pelas decepções, a oportunidade de realizá-lo chegando discretamente, a ansiedade, e o êxito. Toda realização de um sonho romântico devia ser assim: no colo da família, com piadas e sorrisos, entre deliciosas comidas e poltronas de sofás. Todo amor devia chegar assim: silenciosamente, envergonhado e confiante, avassalador e sorridente.
   Hoje realizei um desses sonhos gigantes que nos acompanham nossa vida toda. Um sonho destes simples e bobinhos, mas que o tempo sem oportunidade faz do êxito um grande prêmio. Ao realizá-lo encontrei um motivo pra ter demorado tanto, não podia ser de outro jeito, em outro tempo, era hoje o dia certo, eram eles as pessoas ideais. E foi, como os sonhos devem ser, perfeito.
   Podia ter sido o nascimento de um filho meu, podia ser meu casamento, ou o batizado de um afilhado, podia ter sido minha formatura, ou o casamento de um dos meus irmãos. Contudo, grandes realizações podem ser coisas simples como conhecer a família daquele que se ama. Busquei a roupa perfeita e não a encontrei, uma vez acontecendo pouco importava o que eu vestia. Meu cabelo precisava estar em ordem, mesmo depois do uso do capacete, e chegando lá nem me lembrei de procurar um espelho. Tentei com a maquiagem cobrir as imperfeições com o mínimo possível, queria dar uma boa impressão sem parecer forçado, e nem a retoquei. Minha impressão era ótima e já bastava. Pensei em comer pouco, falar pouco, sentar direito, controlar gírias e correções, ser carinhosa, mas contida... E estando lá comi bem, falei o que quis, não reparei como sentei. Fui eu mesma, feliz, realizada. Teoricamente eu sabia que isso iria acontecer, teoricamente eu sabia que era isso o mais importante, mas minha mão trêmula e fria, meu estômago doendo enquanto eu me arrumava, e ele chegando antes do horário marcado, fizeram-me desesperada.
   Fico feliz que tenha sido assim, o deslumbramento do acontecido deu-se também graças a ansiedade. Os prazeres que repeti, sinceramente, a cada um que conheci e de que os nomes já vou me esquecendo, também foram efeito da - longa - espera. Quando finalmente o nervosismo passou, aproveitei. Ri, conversei, revelei-me, descobri as pessoas, admirei meu amor. Realizei-me, como nem em sonho eu imaginava.

Ana Kita

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Desafios da dança - Ana Kita

   Eu, que já dancei por anos quase que exclusivamente com o homem por quem eu era apaixonada, que comecei e só dancei por muito tempo com meu avô, que já vivi fases de muitos parceiros sem qualquer critério, demorei muito para entender que na dança há muito mais que técnica e ritmo, é preciso sentir o outro e se sentir, não há espaço para temores ou desentendimentos, desconfianças ou preocupações, o mundo precisa se apagar e preciso me entregar, tenho que confiar, respeitar e acompanhar meu parceiro por todo o novo universo que a canção nos permitir desbravar, necessito de coragem e segurança para finalmente me despir de preconceitos ou dores, abandonar as regras e a física, poder tudo, ser abelha e voar, sermos dois e ocuparmos o mesmo espaço.

Ana Kita

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Quanto ao tempo e aos olhares

   Eu, que sempre quis me prender ao passado, descobri que o importante acontece agora. Sempre agora. Em todos os momentos em que sinto. Ah, tenho sentido muito. Vivido intensamente, como quase não creia ser possível. Amado muito, como todos deveriam. E sido amada, como mereço. Não é presunção, é uma questão de visualizar, ver que tudo até aqui me preparou, e sinto-me pronta, guerreira, vitoriosa.
   Olho para o céu, azul e sem nuvens (ou cheio de nuvens escuras, ou poucas branquinhas), e penso naquele que quero para compartilhar o presente e sonhar o futuro. Olho para a estrada a minha frente, iluminada e florida (ou de folhas secas e nublada, ou molhada e escura), e sinto a companhia daquele que quero sempre comigo. Fecho os olhos, deito confortavelmente em minha cama (ou torta no assento de um carro, ou apoiada sob um peito palpitante), e sorrio animada.

Ana Kita

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Cuide-se!

   Quem ama cuida, sempre me disseram. E assim eu sentia, por mãe, pai, professores, avós, tios. Assim eu fazia com mãe, pai, amigos, irmãos, primos, tios, alunos. Mas, creio que tenha sido apenas reflexo, costume, "ação condicionada". Depois de muito cuidar, e ser cuidada, acho que por fim entendi o valor disso tudo. É amor. É o amor que me move todos os dias a beijar minha mãe, a lembrar do meu pai, a abraçar meus amigos, a ler para meu irmãozinho ou perguntar ao mais velho sobre seus estudos, a sentir saudade dos meus primos e mandar chocolates na Páscoa, a passar protetor na minha tia ou ajudar meu tio com "flertes", a verificar as fraldas de meus alunos, a pedir que meu querido coloque o casaco. Ah, cuidar pode dar trabalho, até dor de cabeça, tirar o sono, mas o retorno é imediato e duradouro. Vejo meus amados bem, sinto suas gratidões e tenho seus bons sentimentos. O que mais é amar além de ser feliz pela felicidade do outro?
   Amo, e sou amada.

Ana Kita