domingo, 30 de maio de 2010

Canção: Tententender - Pouca Vogal

Composição: Duca Leindecker / Humberto Gessinger

Se eu disser que vi rastejar
A sombra do avião feito cobra no chão
Tententender minha alegria
A sombra mostrou o que a luz escondia

Se eu quiser ser mais direto
Vou me perder, melhor deixar quieto
Tententender, tentenxergar
O meu olhar pela janela do avião

Que amor era esse
Que não saiu do chão?
Não saiu do lugar
Só fez rastejar o coração

Se eu disser que tive na mão
A bola do jogo, não acredite
Tententender minha ironia
Se eu disser que já sabia

O jogo acabou de repente
O céu desabou sobre a gente
Tententender, quero abrigo
E não consigo ser mais direto

Que amor era esse
Que não saiu do chão?
Não saiu do lugar
Só fez rastejar o coração

-> Dedico esta letra a Cami, mais uma que gosta.

sábado, 29 de maio de 2010

Quanto aos sofrimentos e às contradições amorosas

É só contradição. Amor.

Estar perto, estar longe. Sozinha, com ele. Triste, imensamente feliz. Despedaçada, plena. Com medo, segura. Com dúvida, certeza. Amada, abandonada. Um mês, breve.

Preciso confessar que nunca entendi nada sobre o amor. Preciso aprender que o amor não é algo que se entende. A cada suspiro descubro a imensidão desse sentimento. A cada batimento percebo o motivo da minha existência.
Acredite no acaso, ou não. Acredite no que escrevo, ou não. Sinta o mesmo, ou se esconda. Esteja comigo, ou me esqueça. Declare seu amor, ou não me entenda. Abraça-me agora (para sempre), ou afasta-se daquilo que sente. Faça-me companhia na chuva, na noite, na música, na praia, no museu. Não mate quem somos, não deixarei que morra aos poucos. Não posso morrer sem ter vivido.

Vejas a mim como árvore, gero teu fruto, acolho teu corpo, protejo teus sonhos. Não temas: tenho raízes firmes confie em mim, quando quiseres pode me cortar da tua vida num só instante, e prometo não ser um peso a ti.

Se continuo aqui, se ouço uma doce canção, se escrevo com poesia é só porque sinto. Sinto uma imensidão. Não vou deixar de ter minha vida, mas seria sua presença que lhe daria sentido. Releio palavras, revejo sorrisos, recordo momentos... Lágrimas brilhantes escorrem de meus olhos. Não é tristeza, é a felicidade pedindo vida. Tanta coisa vivida, tanta coisa sentida, e tão poucos dias. O tempo é relativo, mas, a vida nos relacionou. Como negar? As janelas estão abertas, quero luz. A porta está aberta, quero você.
Não é loucura, agora eu sei. Não é fascinação, ilusão ou confusão... É amor. É um sentimento que no conceito de alguém pode ser "afeto, admiração e respeito". Eu sinto além, mas esta sou eu. Sou eu assim, se respiro poesia, se articulo palavras sentimentais é da minha natureza, é da minha vontade. Seja quem é. Amar é dar liberdade. Não quero amarras, não preciso de promessas. Quero amor, quero amar, fazer bem... Olhar sem medo, completar as lacunas, abraçar por inteiro... Entregar-me, esquecer regras, tabus, equívocos... Quero aprender, ensinar, quero compartilhar... Quero viver. Viver, lembrar, transformar... Buscar a felicidade (possível ou não) - contigo e nossa.

"Me diz como é que eu faço, me diz como é que eu posso te encontrar mais uma vez, pela primeira vez" Humberto Gessinger
Ana Kita


-> Conceito de amor como "afeto, admiração e respeito" é de alguém que é muitíssimo especial para mim, Felipe Rodrigues.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Textofonia 11: "que pudesses me ver"

Luz. O raio de sol ou a luminosidade de alguém especial não depende além de mim. Sou eu quem pode ser abrigo, refletor ou transponível. A decisão cabe a mim.
Gosto. Passo o dia a preferir. A roupa de vestir, o verbo de usar, o texto de escrever. Se fossem caminhos, todos se cruzariam, não haveriam placas, nem regras. As escolhas seguem uma só motivação: gostar. De gosto em gosto, o destino é sempre o mesmo.
Rabiscos. Pensamentos isolados, pensamentos constantes. Ideias que voam, desejos que se verbalizam. Mãos descontroladas, sentimentos dominadores. Vontades como brisas trazendo arrepio, levando saudades. Acolhem-me na solidão.
Olhos. Um olhar distante, a busca insistente por alguém que não encontro. Olhos úmidos, brilhantes. Olhos que acreditam, olhos que aquecem. Olhos invadidos, olhos que penetram. Olhos humildes, aconchegantes. Duas gotas de uma imensidão oceânica, uma certeza e uma pergunta, silenciosas.
Passado. Páginas de calendários amassadas. Palavras ao vento que perdidas voltaram. Lembranças dos dias que virão. Pedidos, promessas. Juras de amor sussurradas no ouvido. Mãos dadas, corpos aquecidos. Nada fazia sentido, eu só descobriria pelo acaso de uma canção.

Ana Kita


-> Auxílio da canção "Giz" - Legião Urbana.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Quanto ao que realmente importa [?]

Lá fora há nuvens escuras, e há lua. Se tu não vires a lua dirás que o céu está feio? (O que realmente te importa? O que deve importar? Que importância a mim dás?)

Queira eu participar do senso comum ou não, as dúvidas e as dores veem me acordar. Fui criada na e pela sociedade, não posso me desvincular tão facilmente. O que sinto é quase instintivo, inato, não posso conter, não há como descrever por completo. Mas, o que penso, o que surge aos meus olhos como ciscos, estes são extremamente influenciados pela sociedade.
Na contradição, querendo andar na contra-mão sou obrigada a sofrer as dores casuais dos marginalizados. Tento me calar enquanto consigo. Conter meus labirintos. Fico a mostrar o que sinto, se uso signos é porque necessito. Não minto.
Se consegue ler pensamentos: pois que leia. Se não pode sentir como eu... Nossos caminhos hão de se perder na imensidão.
Sofro ao querer o não, lamento quando penso na distância. Almejo uma união, mesmo sabendo que para ela será necessário mais que uma escolha, um rompimento. É por ele que temo. Não quero e não me sinto forte para viver sem tudo que construímos. Nada construímos, quero construir. Ganhei toda a matéria prima mais que necessária, sinto que ele também ganhou, posso compartilhar um tanto do que tenho.
Deito. As lágrimas escorrem saltitantes com os suspiros ofegantes. Os batimentos acelerados chegam a doer. Não queria sofrer, não queria verbalizar minha dor, não devo compartilhar. Faço sempre o contrário, e no fim não me arrependo. É loucura amar, pois que seja loucura também lutar, expressar, querer e viver. Fecho meus olhos, cansados de insônia, já não busco o sono, só não quero ver. Temo o que posso alcançar, espero o tempo que virá.
Já não sei o que é certo, o que é mutável. Nunca tive certeza do que poderia transformar, nem de quem passei a ser. Se antes de dormir posso voar num pensamento, se meu nome puder despertar um sorriso, se minha imagem flutuar em sonhos, alguém precisa me revelar. Quando eu souber da reciprocidade do meu honesto sentimento saberei - de fato - que valeu a pena viver este momento.

Ana Kita

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Quanto ao tempo e às certezas, ou falta delas

O sol me sorri amarelo pelas frestas da cortina. Você me sorri azul, aqui dentro. Se o sorriso que vejo, as palavras que leio, as sensações que tenho... Os sentimentos que sinto não forem reais, não me diga ainda. Cale-se, cale um silêncio vermelho. Intenso, quente, cruel. Posso me queimar com a ilusão trazida no silêncio, sei que sim. Não me importo. Enquanto há um mundo azul dentro de mim todos os dias são especiais. Sinto-me já não no céu, sou agora o próprio céu. Os raios que sonho oferecidos por você me banham de luz, esperança. Nem digo de amor, estou submersa nele.
Talvez seja a contradição do sol quente e o outono frio, talvez a contradição de nunca ter me sentido tão próxima a alguém e mesmo assim esteja eu lamentando a distância. Pois que sejam só as contradições naturais do amor. Torcidas contrárias, manias que perturbam, falar sempre em disco voador e só querer saber de show de rock'n roll. Penso que entre todas as contradições que nos aproximam, tão simples quanto o encontro de lábios, podemos sentir a envolvente sensação de "para sempre" sempre acabar. Acreditaremos, sonho.
Os raios de sol que invadem a sala ao sabor do vento me remetem a ideia de que no mesmo céu em que há sol, há também a lua. Nós, simples humanos de coração, deixamos de notar um para admirar o outro. Ora esquecemos que um outro exista, ora nos encantamos com a coexistência. Não podemos escolher entre um e outro, não há motivo. Há preferência. Querer o agito de um, a poesia do outro. Os diversos sons, o silêncio. A plenitude, a inconstância. Querer a mim ou trancar-se no porão.
Houve um tempo em que o tempo fora contato pelos astros. Tantas luas, tantos sóis. Hoje evito contar, passam-se tantos e permaneço tão só. Calo-me, calo o cinzento silêncio da dúvida. A brevidade da certeza é reticência. Não sei por que uso. Uso por ser fundamental, inato, honesto. Uso para expressar o que sinto, para silenciar o que não posso sentir. Não tema minha incoerência, é só contradição. Fuja e diga, fique e sinta. Não espere de mim mais do que um brisa, tento ser suave, tento ser amiga. Tento ser breve, e termino ventania.

Ana Kita

"Azul, vermelho pelo espelho a vida vai passar e o tempo está no pensamento" Cidadão Quem
"Vou chorar sem medo, vou lembrar do tempo de onde via o mundo azul" Nenhum de Nós
"Se alguém já lhe deu a mão e não pediu nada em troca, pense bem, pois é um dia especial, eu sei que não é sempre que a gente encontra alguém, que faça bem e nos leve desse temporal"Cidadão Quem
"Tudo se resume a uma briga de torcidas, e a gente ali no meio, no meio das bandeiras. O jogo não importa, ninguém tá assistindo"Engenheiros do Hawaii
"Ela fala sempre em disco voador e eu só quero mesmo é saber de show de rock'in roll... Mas na hora do calor ela me chama: meu amor! E eu respondo: Meu amor! No fim a gente só dá certo. Mas na hora do calor ela me chama de: Meu bem! Me faz sonhar no vai e vem, e o nosso caso é um sucesso"Roupa Nova
"Pergunte ao pó, desça ao porão, siga aquele carro ou as pegadas que eu deixei" Engenheiros do Hawaii
"Se lembra quando a gente chegou um dia acreditar que tudo era pra sempre, sem saber que o pra sempre sempre acaba. Mas, nada vai conseguir mudar o que ficou, quando penso em alguém só penso em você e aí então estamos bem"Legião Urbana
"Já perdemos muito tempo brincando de perfeição, esquecemos o que somos: simples de coração" Engenheiros do Hawaii
"Se for pra sempre seja breve, seja firme seja leve, seja bravo seja breve, se for pra sempre" Pouca Vogal
"Diga a verdade ao menos uma vez na vida, você se apaixonou pelos meus erros. Não fique pela metade vai enfrente, minha amiga, destrua a razão, deste beco sem saída" Engenheiros do Hawaii
"Vento ventania me leve sem destino, quero juntar-me a você" Biquini Cavadão

domingo, 23 de maio de 2010

Textofonia 10: Aqueça-me com sua luz

Penso em você. Muito.
Imagino banhos de chuva, viagens à praia, filmes sob cobertor. Se estou entre muita gente imagino o quanto seria valioso compartilhar contigo, se estou sozinha imagino como sua presença iluminaria tudo.
Não importa quantos belos acordes eu ouça, em dias como hoje "tenho necessidade de coisas mais afetivas". Shows, conversas com os amigos, leituras... Tudo tem sua importância, sentido na minha vida e trazem enriquecimento. Contudo, não posso comparar nada do que tenho com o que sonho. Meus sonhos incluem sua presença, de corpo e alma. Meus sonhos são a perfeita iluminação de nossas vidas.
Sua voz adorável contrariado-me honestamente. Suas mãos segurando as minhas. Seu corpo acolhido em meu abraço. Seus lábios se aproximando dos meus. Sua mente em sintonia com a minha. Seu coração compassado junto ao meu. A mais pura poesia.
Dia e noite sem parar, eu procuro a palavra que o trará para mim. Foi tudo rápido demais, e a cada dia sinto, mais intenso, que você sabe a atitude certa a tomar. Enquanto não a toma continuamos a sentir, a imaginar, a viver separados, a sofrer com o inverno de um outono solitário. Mesmo sem a intenção, algumas de suas palavras, algumas atitudes que posso ver, e toda a distância que temos que manter vão tirando minhas forças. Quero resistir, mas sem sua luz não sou capaz.
Dê-me uma dica, uma só esperança de que tudo que tanto precisamos você trará em breve. Diga-me que deseja tanto quanto eu e terei paciência. Preciso, apenas, mergulhar em seus olhos brilhantes e sentir-me amada. Serei sempre sua luz, é só se (e me) permitir.

-> Auxílio sonoro de "Eu que não amo você", de Engenheiros do Hawaii.

sábado, 22 de maio de 2010

Canção: Luz - Engenheiros do Hawaii

Composição: Humberto Gessinger

Onde estão teus olhos
Agora que tô bem na foto
Agora que achei o foco
Onde estão teus olhos
Sem eles não existo
Fico cego invisível
Queimo o filme rasgo a foto
Onde estão teus olhos
Agora que domei a fera
Agora que a dor já era
Onde estão teus olhos
Sem eles não existo
Fico cego invisível
Só enxergo o silêncio
Juntos para sempre
Objeto e observador
Física moderna
Velhas canções de amor
Onde estão teus olhos
Onde estão teus olhos
Longe deles nada existe
Onde estão teus olhos
Onde estão teus olhos
Longe deles nada existe

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Quanto aos questionamentos e à felicidade alheia

Quintas-feiras nunca foram bons dias para mim. Minha mãe diria que o problema começa com meu pensamento pessimista (e até supersticioso, mas isto ela não me diria). Mães costumam ter razão. O que ela me diria se eu perguntasse como trazer para mim quem amo? Ela diria tantas coisas que eu acabaria ignorando. Comum erro dos filhos, ignorar. Engraçado que não é falta de amor. O amor, entre mãe e filho, é incondicional. Meu objetivo provavelmente seria de me preservar. Preferível não saber se não farei. Quando amamos queremos o bem do outro, ela não se magoaria. Minha mãe me daria carinho, e se calaria.

Seria isso uma metáfora para a atitude que devo tomar? Fui eu que a fiz, devo considerar que meu racional julga como o correto a fazer? Por que é tão difícil? Sempre digo que sou romântica, os outros me julgam assim também. Não deveria eu ser como costumo ser e deixar a emoção me guiar? Estaria fazendo a mesma coisa mais uma vez. Se não deu certo antes, por que agora daria? Determinar o insucesso de uma nova história me baseando na passada não é subestimar as novas personagens? Eu mesma já não sou a mesma, sendo assim não posso ter a mesma postura. Sendo ele diferente das anteriores deve ter sentimentos, atitudes igualmente diferentes. Nem por isso mais positivas.
Considerando a temática amor teoricamente só uma poderia alcançar êxito realmente, mas ninguém (exceto eu e ele a vivendo) pode me confirmar que seja este o momento e nós as personagens para a tal história. Se tivesse eu mais habilidade - ou sorte - neste aspecto não conheceria o abismo. Também não teria tanto a escrever - como no forró do Falamansa: "quanto mais triste mais bonito soa, eu agradeço por poder cantar".
O pensamento de outro momento confuso e melancólico faz com que eu possa ver a felicidade dele. Pode ser apenas alegria momentânea, sentimento confuso - este retribuído por outra, e estimulante a ambos -, e até mesmo ter fim em breve. Se não tiver? Posso ficar sentada logo ao lado assistindo a sua vida? Esperando minha vez de participar? Não é absurdo? Desvalorização da pessoa amável que sou? Menosprezo a minha própria vida? Se ele entrou na minha vida, deixou meu mundo de pernas pro ar, faz-me questionar tanto sobre o melhor para nós, acelera meus batimentos, enriquece minha poesia, alegra meus dias, posso viver sem? A ideia da ignorância ser confortável, uma vez que eu não conseguiria agir seguindo as possíveis respostas negativas (perante o olhar desejoso), parece novamente me agradar. Lamento.
Eu o amo. Só.

Ana Kita

Peço desculpa, desta vez ao invés de agradecer possíveis identificações, se minhas dúvidas forem as de alguém. Gostaria que minhas palavras melancólicas não despertassem lágrimas a ninguém. Caso ocorra melhor que considerem que não estão sós. Talvez seja um consolo, desconheço, porque ainda é quinta: me sinto só.
Lembrou-me outra canção, preciso compartilhar. Ando Só de Humberto Gessinger:
"ando só
nem sei por quê
não me pergunte
o que eu não sei

pergunte ao pó
desça ao porão
siga aquele carro
ou as pegadas que eu deixei

(...)

desate o nó que te prendeu
a uma pessoa que nunca te mereceu
desate o nó que nos uniu
num desatino num desafio"

Amor, sigo tuas pistas - Ana Kita

Cássio sozinho na casa do amigo questionava-se de onde viera a ideia de presentear professores com maças. Por que não uma laranja? Ele iria gostar mais. Ainda assim não fazia sentido, não conseguia se imaginar presenteando alguém com uma fruta. Quem dirá um professor com o fruto proibido. Ria sozinho de suas ideias. Não sabia como partiu para aquela viagem, embora o filme ao qual assistia, Encontrando Forrester, estivesse ambientado numa escola, não mencionava qualquer ideia sobre maçãs.
Quando o filme acabou , deitou-se no primeiro quarto que encontrou, pertencesse a quem fosse. Havia um rádio relógio no criado-mudo, apaixonado por música ligou sem se importar com a rádio sintonizada. Assuntou-se ao ouvir o radialista anunciando “mais um bolero para aquecer seu coração”. Quem ouvia uma rádio assim? O que mais lhe surpreendeu foi reconhecer o refrão do bolero. Demorou a descobrir onde já ouvira. Num pagode? Sim, aquela ideia do filme era real, estamos sempre nos apropriando do que conhecemos, transformando e tomando posse. Cássio quase perdeu o raciocínio encantado com o perfume do travesseiro. A quem pertencia? Tentando retornar à ideia, proferiu algo que já parecia ter lido: “No mundo artístico você precisa mais do que criatividade, é fundamental ter bagagem.”
A canção terminou, e a porta se abriu. Um grito feminino. Cássio pulou da cama tentando explicar que era hóspede da família. Laura não queria ouvir nada. A cueca azul do rapaz a deixara histérica demais para que pudesse compreender qualquer coisa que ele dissesse. Cássio se vestia apressado. Falava milhares de coisas desconexas que nem ele sabia o que estava dizendo. Demorou alguns boleros para que se acalmassem. Com um pouco de conversa entenderam a confusão.
Laura havia voltado de viagem naquele dia, por isso não sabia da presença do amigo do irmão. Para dois estranhos que a pouco gritavam a conversa se desenvolveu muito bem. Descobriram a mesma preferência de filmes. Além do DVD dela que ele acabara de assistir, o predileto de ambos era Escritores da Liberdade. Ele ficara encantando com as experiências dela, a última praia que ela visitara parecia surreal em suas descrições. Para ser sincero, Cássio achava tudo que a garota lhe dizia como passagens de um livro poético.
A moreninha era suave e adorável, tinham tanto em comum, e era tão linda. Enquanto ele delirava no movimento dos lábios dela, ela repetia pela terceira vez a mesma pergunta: “O Felipe, onde está?” Cássio caiu em si. Embora fosse trabalhoso desviar os olhos do top amarelo que a garota vestia, conseguiu responder. “Ele foi produzir o Efeito Borboleta” – brincou. Queria dizer alugar o DVD, porém a locadora era na esquina e o amigo havia saído a mais de uma hora. Ambos conheciam Felipe muito bem. Sabiam que ele teria parado para conversar com alguma conhecida e perdido a noção do tempo. Se é que ele a possuía.
No rádio começou a tocar Infinita Highway, ambos cantaram. “Nossa, você também gosta de Engenheiros?” – questionou Cássio sorrindo. Parecia brincadeira, Laura era fã de carteirinha desde criança. Aprendera a tocar violão só para tentar tocar canções da banda. Cássio se sentia apaixonado, justamente ele, tão cético e questionador, de repente sentia tanto do que nunca acreditara. Estaria acreditando em “amor à primeira vista”? Ele segurou a mão dela, ela se aproximou. Tentou beijá-la, ela colocou a mão nos lábios dele. “Uma última pergunta - tudo isso não parece real. Seu livro favorito?” Ele deveria responder honestamente alguma ficção com temática política, mas sobre a escrivaninha podia ver um clássico. Acertou em cheio: “Dom Casmurro”. Ela o beijou.

Ana Kita

-> Conto produzido sobre a orientação do professor Pablo Pereira, no Curso Persona.
-> Imagem do filme Efeito Borboleta.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Textofonia 9: Ame ao meu lado

Na primeira vez que nossos olhares se cruzaram todo o cenário se desmanchou aos meus olhos. Foi tão evidente, temi até que os outros notassem. É impossível reprimir um sentimento honesto, avassalador. Seus olhos continuaram dentro dos meus. Escuros, cintilantes. Senti, ainda sinto, como se você sentisse o mesmo. É por isso que não entendo o abismo entre nossos corpos. Se desde o princípio pudemos nos unir num só, o que ainda faz tão afastado?
Pressinto que meus sonhos sejam também seus. Tudo que tenho desejado são seus olhos me iluminando, seus braços me acolhendo, seus lábios me... Façam o que quiser, quero tê-lo ao meu lado, e o resto do mundo não mais existirá. Diga tudo que quiser, sussurre tudo que sentir, cante! Sorria, beije-me, morda-me! Grite, cale-se!
Se estiver deste lado podemos ficar parados, voar, caminhar, navegar... Não teremos mais corpos, nem seremos barrados por muros. Seremos livres de tudo que é material, de tudo que é irracional. Alguns nos chamarão "loucos", sem que saibam que loucura é estarem presos a coisas tão irreais. A verdade está no seu olhar. Se duvidar: encontre no meu. No toque de nossas peles, nos conflitos de nossas ideias, nas letras de nossas canções, nos aromas das flores que desabrocham, nos raios de sol. Em tudo que você puder olhar, tocar, cheirar, sentir... Amar.

Ana Kita

-> Canção utilizada: "A verdade a ver navios" - Engenheiros do Hawaii. Sugestão de um comentário numa postagem recente.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Canção: Vamos Fazer Um Filme - Legião Urbana

Composição: Renato Russo

Achei um 3x4 teu e não quis acreditar
Que tinha sido há tanto tempo atrás
Um bom exemplo de bondade e respeito
Do que o verdadeiro amor é capaz
A minha escola não tem personagem
A minha escola tem gente de verdade
Alguém falou do fim-do-mundo,
O fim-do-mundo já passou
Vamos começar de novo:
Um por todos, todos por um

O sistema é mau, mas minha turma é legal
Viver é foda, morrer é difícil
Te ver é uma necessidade
Vamos fazer um filme

O sistema é mau, mas minha turma é legal
Viver é foda, morrer é difícil
Te ver é uma necessidade
Vamos fazer um filme
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?

Sem essa de que: "Estou sozinho."
Somos muito mais que isso
Somos pingüim, somos golfinho
Homem, sereia e beija-flor
Leão, leoa e leão-marinho
Eu preciso e quero ter carinho, liberdade e respeito
Chega de opressão:
Quero viver a minha vida em paz
Quero um milhão de amigos
Quero irmãos e irmãs
Deve de ser cisma minha
Mas a única maneira ainda
De imaginar a minha vida
É vê-la como um musical dos anos trinta
E no meio de uma depressão
Te ver e ter beleza e fantasia.

E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
E hoje em dia, como é que se diz: "Eu te amo."?
E hoje em dia, vamos Fazer um filme
Eu te amo
Eu te amo
Eu te amo

-> Dedico esta postagem e, provavelmente, as que virão depois de conhecer esta letra ao Ítalo, que comentou sobre a canção. Não a conhecia, mas me encantei demais.

domingo, 16 de maio de 2010

Carta a ele 5: Por sua (in)decisão

Aqui, hoje.

A alguém (melhor se não for a ninguém),

Escreva-me tão logo queira. Escreva-me tão logo sinta o mesmo, ou possa entender meus sentimentos.
Hoje sinto como se minhas acelerações cardíacas fossem, exclusivamente, causadas pelas angústias torturadoras de minhas esperanças. Ora sorrisos, ora lágrimas. Perco a noção do tempo. Vejo o dia em que nossos passos nos levaram ao mesmo cruzamento e seguiram direções opostas. Parece ontem. Já passaram luas demais? Continuamos na mesma estrada, com um abismo entre nossos corpos. Mentes unidas? Talvez afeto, talvez atração, talvez admiração... Nada disso será suficiente se não houver um sentimento que decida militar contra a correnteza. Você pode optar por seguir o trajeto deste rio, mas prevejo no fim uma queda d'água.
Não queremos feridos. Permita que os demais também se salvem. Alcance minha mão e diga aos outros, para que não se machuquem demais. Se eu estiver errada, ignore. Rasgue minhas palavras, e avise-me, sem se preocupar com meus pedaços. Hão de se recuperar. Você gosta de estar no comando, e desejo que segure firme as rédeas desta situação. A brevidade do tempo é imprevisível, não protele sua decisão. Jamais deixaria você escapar, é só tocar minha mão.
Caminho pelas ruas. Vejo paisagens, pessoas. Ouço canções, discursos, ruídos. Folheio folhas de um livro, aperto teclas, seguro uma caneta. Tento pensar e fazer qualquer coisa que não o envolva. Relaciono tudo a você. Vou a um show, assisto a um teatro, desejo sua companhia. Canto uma música, ignoro um alarme telefônico, lembro-me de sua voz. Leio algumas páginas, digito algumas frases, faço um desenho bobo, reflito sobre o que nos envolve. Num instante quero mandar uma mensagem, fazer uma ligação, implorar para que me encontre. Reprimo.
Se ver esta carta como um manifesto tímido, entregue-se. Venha até mim, abrace-me. Cantemos juntos, troquemos palavras sinceras, vislumbremos o nascer do sol. Se encontrar apenas palavras soando bonitas ou imaturas, faça o que eu deveria fazer, esqueça. Apague de sua memória os caminhos que o levam a mim, não abra as páginas, não ouça as canções. Não retribua ao carinho, contenha sua vontade de falar comigo.
Não quero lhe pertubar com minhas ideias. O que você sente (ainda) não me pertence, posso estar completamente equivocada em minhas interpretações. Se me apego a elas é só porque gosto delas. Continue na leveza de sua (in)decisão.

Com todo meu amor, sua Ana.

sábado, 15 de maio de 2010

Quanto aos desejos e "às causas perdidas"

Embora este não seja um texto que faço ouvindo uma canção, preciso citar um trecho de "Dom Quixote" de Humberto Gessinger. "Por amor às causas perdidas".
Sou romântica incansável, confesso. Não sei se a última do românticos, a primeira da família, ou apenas uma entre muitos. Sei é que prefiro a ingenuidade de crer no amor, do que o lamento de não ter esperança. De que outra forma eu teria vontade de acordar todas os dias? De que forma meus lábios desejariam sorrir? Eu vejo a esperança como uma rodinha que move o mundo.
Enquanto houver amor, haverá esperança.
Talvez esta seja a parte mais menina de mim.
Quem sabe - embora eu tenha passado por poucas e boas no capítulo "Histórias de Amor, ou não" da minha biografia - eu ainda precise gerar muitas correntezas lacrimosas para cair na real. Eu penso que não. Penso que a vida seja uma verdadeira correnteza, a beleza está nesse movimento. Ora intensa, ora suave. Penso que o amor seja um grande impulso dessa correnteza e depende apenas de mim como navegarei.
Não entenda esse "depende apenas de mim" como desdenho aos amigos, à família ou aos tripulantes anônimos que vêm e vão em minha embarcação. Adoro ver outros barcos, peço e aceito ajuda com as velas. Algumas vezes, com os remos. Sou difícil de lidar, tem dias que grito meu desejo de ir à deriva. Não é para entender. Digo que seria impossível.
Venha comigo, ou siga sua própria corrente. Ficarei contente por você, sempre.

Ana Kita


Textofonia 8: Sorriso especial

Todo dia - desde o dia em que começamos a nos falar - é um dia especial. Mais e mais. Vejo no brilho do teu olhar, na sinceridade de tuas palavras, na vibração do teu corpo... Não há o que duvidar. O amor é maior que tudo. Quando o sentimento é assim naturalmente sublime posso resistir a tudo, posso enfrentar, posso aguardar. Porque o sorriso vai sempre me acordar e fazer com que eu deite me lembrando de ti.
Não temo, não tenho mais pressa. É só olhar em teus olhos escuros e tudo fica claro. Claramente feliz! Sinto que minhas palavras sinceras também podem refletir teus sentimentos. Anseio do começo ao fim. A reciprocidade é toda poesia. Não peço, não exijo, não espero. Apenas sinto. Quero te fazer bem. Farei tudo que eu puder para ver em teus lábios a alegria que tu tens dado aos meus.
Se tenho gripe, se tenho fome, se não consigo dormir. Enquanto amo, o mal cessa. É só tu existires. Se passas a existir em mim, o amor transborda com raios de sol especialmente as noites. As únicas notas são nossos corações compassados. Tudo isso que acontece entre nós, talvez seja eterno. Não há mal se tiver fim, se precisares partir saberei guardar a felicidade em mim. Estarei sempre aqui. Mão estendida. Abraço te esperando. Poesia publicada.

Ana


-> Auxílio poético da canção "Dia especial" de Duca Leindecker, na versão com Humberto Gessinger, no Pouca Vogal.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Carta a ele 4: Aconchego

Minha cidade, numa noite feliz - números não são tão importantes.


A você,

em outros tempos eu lhe diria muita coisa. Vontade até confesso sentir um pouco. Hoje sinto que algumas abstrações permitem interpretações a mais pessoas e pode aconchegar outros corações acelerados. Sim, se quer uma notícia meu coração está. Se quer um desejo, eis o meu: você aconchegado por minhas palavras.
No filme Matrix, é dito que o amor acontece na certeza de um apaixonado. Hoje essa é a minha verdade. Recordo o livro "Convite à Filosofia" e meu professor de Filosofia. Verdade é a coerência entre o que se sente, o que se pensa, o que se fala, e o que se faz. A verdade é que sinto, penso, falo e faço a favor de nós, feliz por todo contato. Transpiro esse amor.
Quero lhe dizer que embora as letras uma vez unidas possam formar apenas palavras sem sentido, quando elas formam sentimentos conseguem me levar. Geram sorrisos, inspiração, conseguem amarrar e dar toda liberdade. Se algo lhe soar contradição não tema, viva o amor e tudo lhe fará também sentido. As melhores interpretações só pedem sensibilidade e repertório. Acredito nos seus.
Acredito em você, acredito em mim. Ouso acreditar no "nós". Sinto-me uma babá que observa a inocência e felicidade da vida nesses primeiros passos. Depende dessa visão a capacidade da felicidade de se perpetuar e gerar frutos. Os passos seguintes somos nós quem damos. Hoje sinto que já escolhemos a direção, a mesma. Só aqueles que amam são capazes de sentir a imensa alegria que sinto hoje, é aquela inata plenitude de amar e ser amado - é no colo materno que a descobrimos.
Não quero que se sinta pressionado. Pelo contrário, ofereço-lhe toda liberdade. Vivamos! Esta é minha decisão e alternativa verdadeira. Não precisa esconder de mim os pontos de interrogação, os afetos contidos e os exagerados. Seja você. Eu posso amá-lo e farei todo o possível para a felicidade de nossas vidas. Perto. Longe. Juntos. Não há ordem. "Disciplina é liberdade". O melhor que posso lhe oferecer é o mais verdadeiro de mim. Nenhuma perfeição, é claro. Sinceridade, poesia e o melhor do que sinto.
Escreva-me tão logo queira. Se não tiver pressa não se preocupe, estarei relendo o que há de melhor aos meus olhos.

Com todo meu feliz carinho, sua Ana.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Quanto aos sentimentos e às sensações MARAVILHOSAS!

(Foto de minha autoria, em 12/05/2010.)

[Talvez hoje fosse o dia que eu mais tivesse que escrever, seja no blog, seja no word, ou numa folha de papel (até que o fiz), mas o texto que criei à tarde/noite já "traduz" o essencial quanto a hoje. Só uma explicação: Pocket Show de Humberto Gessinger, autógrafos do seu livro "Pra ser sincero - 123 variações sobre um mesmo tema" e o DVD Pouca Vogal.]


Quanto aos sentimentos e às sensações MARAVILHOSAS

Eu sentada. Devia dizer lendo, confesso que esperando. O livro? Ótimo. Aquele tipo que não quero parar de ler, ao contrário, quero devorá-lo com todas minhas forças. Não anseio pelo final, desejo cada palavra. Lamento conhecer o ponto final, e seguro-me para não voltar a ler.
Volta e meia - assim como passei a usar a expressão - preciso olhar ao redor, conferir, aguardar sua chegada. E se ela destruir o sonho? Sei que a onda não leva a areia, sei que podemos sempre refazer castelos. Perdão, fui criada naquela tradição que tenta eternizar a poesia. Penso tanto na possibilidade de me decepcionar que quase acredito que não é mais possível.
Olho mais uma vez para trás, busco meu futuro - busco você nele. Se eu gostasse de estatísticas eu diria que a cada dez casais passou um unitário. Pouco provável?

Se eu tivesse a força que você pensa que eu tenho: eternizaria aquele momento. Ali, aqui, aí. Vontade, saudade do meu futuro. Lembrança, lágrima. Hoje para sempre. Você. Minha estrela. [s?]

Ana Kita (fascinada, emocionada... amando.)


-> "Quanto à" vida, minha. hehe Mais uma parte desse "projeto".

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Textofonia 7: Faz-me bem, meu bem

"Se o sangue ainda corre nas veias é por pura falta de opção" alguém poderia me dizer, e Humberto Gessinger fica repetindo no presente que você me deu. Não costumo discordar das letras da minha banda favorita, mas se eu aplicar a nossa história renego esta afirmação.
Não é falta de opção, meu corpo decidiu pelo lógico. Não é assim com todo mundo? Não costuma ir pelo que mais lhe faz bem? Este é ponto de rir, de fugir das letras os olhos. Talvez me considere louca, ao menos sua testa irá franzir como a questionar: "O que fiz eu para tanto?" E algum poeta pode sanar suas dúvidas. Há tantos poemas cuja temática são as razões de se amar,"não o amo pelo que é, mas por quem me torno ao seu lado".
Foi assim comigo desde a leitura de suas primeiras palavras destinadas à mim. Prometo-lhe não ceder à poesia e acabar sendo hipócrita. Sei que repetidas vezes você me tornou irritada, revoltada, até grosseira. Mal consigo classificá-los como sentimentos, soam-me muito mais como simples sensações. Após cada conflito pude absorver seu parecer, seus argumentos tornaram-me também meus (há estudos sobre isto, tem a ver com a "memória coletiva"), e - na marra - amadureci com suas críticas tão bem pautadas. Não digo que você mudou minhas opiniões, faltaria muitas conversas para tal, apenas evidencio aquela frase que repetidamente cito de Saint-Exupéry: "Se sou diferente de ti, em vez de, com isto, prejudicar-te, eu te aumento."
Você constantemente me faz alguém melhor. Aprendo muito com você, sobre os assuntos que já conversamos, sobre pessoas de vivências diferentes às minhas, e especialmente sobre mim mesma. Ouso dizer que é você quem proporciona motivos para meus sorrisos nas últimas semanas. Quando entro no ônibus, quando ouço uma música, quando escrevo, quando acordo, quando me deito... Nos mais simples momentos do dia acaba surgindo um pensamento relacionado a você, quando não são quanto a falta que sua presença me faz, fazem-me sorrir. Sinto-me mais completa por tê-lo conhecido. E contraditoriamente, percebo que tenho muito a descobrir e aprender, muitas lições que pode me ensinar, e nas outras me faria um bem enorme se estivesse ao meu lado. Além disso, tenho muito a ensinar, inclusive a você. Temos um mesmo objetivo na vida - não sei se já o descobriu -, talvez juntos poderá ser ainda mais agradável. É como diz na música "Você sabe o que eu quero dizer, não está escrito nos outdoors, por mais que a gente grite, o silêncio é sempre maior". Espero que você não queira também não ouvir, já há tanta gente ignorando por aqui.

Ana Kita


-> Auxílio da canção "Além dos outdoors" de Engenheiros do Hawaii.

domingo, 9 de maio de 2010

Textofonia 6: Àquela que faz quem sou

PRAZER - DESESPERO - ANSIEDADE - ANGÚSTIA - ALEGRIA - ENJÔO - ÂNIMO - PACIÊNCIA - IMPACIÊNCIA - RECEIO - EMOÇÃO - DOR - AMOR - MEDO - REALIZAÇÃO - CANSAÇO - ORGULHO - PARANÓIA - ADMIRAÇÃO - RESPONSABILIDADE - FELICIDADE - INSEGURANÇA - PLENITUDE.

Ousou, recebeu. Aguardou, gerou. Lutou, concebeu. Olhou, amou. Alimentou, conquistou. Protegeu, mereceu. Educou, admirou. Acompanhou, inspirou. Amou, eternizou.

Se o amor pode ser incondicional a condição é haver um laço. Nego-me a ver qualquer laço mais resistente e sublime como o maternal. Não desdenho as mães adotivas ou de criação, pelo contrário, considero-as verdadeiros presentes divinos. No entanto, preciso valorizar aquela dádiva que é gerar em seu ventre. Ter um cordão cortado e construir um elo eterno. Amamentar com seu leite e com seu nutritivo amor. Compreender num só olhar. Conhecer, agradar, adivinhar, proteger, aconselhar, aninhar.

Talvez nenhum filho se sinta capaz de retribuir a tudo que sua mãe lhe destinou. Mal sabe que o maior retorno da terra é ver a árvore crescer, florescer e dar frutos. Não se cria os filhos para si, mas para o mundo. Teme-se que ao sair de seu útero, ao deixar suas asas e ao se mudar do lar os perigos o devorem. Ignora ela que o pecado sempre morou ao lado. Finge não saber que seu amor o criou para o êxito. Esquece-se de que as lições e lembranças não permitiriam que ele se afastasse da paz, dos princípios, e dela própria.

Ana Kita


-> Dedico este texto feito com a canção "Parabólica" de Engenheiros do Hawaii (Humberto Gessinger fez sobre ou para a filha, Clara) para todas as mães merecedoras de todas os cumprimentos e agradecimentos deste dia. Especialmente a minha mãe, a minha madrasta, a minha madrinha Fran (em seu primeiro dia das mães), a minha amiga e futura mamãe, Andréia.

Quanto ao calor e às palavras numa madrugada - Ana Kita

Numa madrugada qualquer como esta ou aquela, um aspirante a poeta dispensa a bebida e a fumaça, não usa a banheira, nem se deixa corromper por uma canção bonita. Ignora que esteja só e recebe companhia. Não está sob a luz da vela e não perde a inspiração. Não conhece o toque da pena, embora escreva com a leveza romântica de outrora. Não se agasalha, contudo tem vivido um outono frio.
Em poucas palavras, algumas linhas que não rabisca, aquece toda a sala. Falta-lhe um abraço, não lhe falta amor. Não consulta um dicionário, cede aos mais belos termos de que se recorda. Olvida as formas, as rimas e todas as regras clássicas, liberta seu sentimento e permite a seus dedos unir letras num só emaranhado sublime.
Suspira.
Não há delírio, orgia, morbidez. Não exige significado, certeza, retribuição. Não possui reconhecimento, dinheiro ou beleza para ir a público. É puro amor que sente. Rende-se à poesia agora e sempre. Está só e só consegue escrever. Verbaliza o que suas veias ora sussurram, ora gritam. Não compartilha, cala-se.

-> Mais um projeto, talvez. "Quanto a".

Poema: "Se tú me olvidas" - Pablo Neruda

Se tú me olvidasPablo Neruda

Quiero que sepas
una cosa.

Tú sabes cómo es esto:
si miro
la luna de cristal, la rama roja
del lento otoño en mi ventana,
si toco
junto al fuego
la impalpable ceniza
o el arrugado cuerpo de la leña,
todo me lleva a ti,
como si todo lo que existe,
aromas, luz, metales,
fueran pequeños barcos que navegan
hacia las islas tuyas que me aguardan.

Ahora bien,
si poco a poco dejas de quererme
dejaré de quererte poco a poco.

Si de pronto
me olvidas
no me busques,
que ya te habré olvidado.

Si consideras largo y loco
el viento de banderas
que pasa por mi vida
y te decides
a dejarme a la orilla
del corazón en que tengo raíces,
piensa
que en ese día,
a esa hora
levantaré los brazos
y saldrán mis raíces
a buscar otra tierra.

Pero
si cada día,
cada hora
sientes que a mí estás destinada
con dulzura implacable.
Si cada día sube
una flor a tus labios a buscarme,
ay amor mío, ay mía,
en mí todo ese fuego se repite,
en mí nada se apaga ni se olvida,
mi amor se nutre de tu amor, amada,
y mientras vivas estará en tus brazos
sin salir de los míos.

sábado, 8 de maio de 2010

Carta a ele 3: Se puder ver o que vejo

Joinville, 8 de maio de 2010.

A você (ou não),

Tenho tanto a lhe dizer, nada posso ou quero. Não tenho novidades, motivação comum às cartas. Não sei como definir os sentimentos que me faz sentir, importante as mesmas. Tampouco sei se me lerá.
Meus olhos brilham quando posso lhe ver, ou algo que lhe represente (como suas palavras constantemente firmes). Em dias como hoje, o fenômeno mais nebuloso não envolve o céu. A maior escuridão existe na falta de contato. Quando não tenho notícias suas, não posso sentir seu carinho ou sua revolta, tudo a que posso me agarrar são lembranças... E lembranças me doem. Dói não fazer novas histórias com apenas nós dois como personagens. Dói não saber se você recorda nossos bons momentos, se é que não os olvidou. Dói imaginar que deve estar fazendo história, que tenha outra personagem.
Passo meu sábado, em casa, lendo, ouvindo, assistindo, imaginando... Entre tantos pensamentos, só penso em você. Uma reportagem no jornal, uma expressão numa conversa, uma canção de nossa banda favorita... Tudo me faz lembrar você. Preciso estudar, mas sobre o livro já conversamos. É só tocá-lo para esquecer tudo que preciso aprender. Só preciso de você. Penso em comer alguma coisa, lembro-me de outra conversa que tivemos e acabo presa em frente ao computador. Tudo que desejo é estar com você. Canto assistindo a um DVD, mas já não ouço minha voz. Em minha mente continua a repetir uma frase sua que li. Um elogio, meu rosto enrubescido.
Não me conte de seu sábado se eu não for gostar. Aguardo ansiosa nosso próximo contato. Desejo que seja mais uma demonstração do quanto é bonito o que nos aproxima, mas, se for apenas mais uma discussão, aguardo a reconciliação. Sei que não é fácil lidar comigo, minhas palavras podem soar planejadas, mas não faço cena. Reconheço minha teimosia e minha interpretação detalhista (algumas vezes equivocada) do que me diz. Só queria que você também visse e soubesse que eu vejo isso que nos une. Sinto como algo tão vivo quanto meus dedos pressionando o teclado... Sei que não costuma acreditar no que não pode ser visto. Penso que isto você pode ver.
Escreva-me tão logo queira.

Com todo meu carinho, sua Ana.

"Quiero que sepas
una cosa.

Tú sabes cómo es esto:
si miro
la luna de cristal, la rama roja
del lento otoño en mi ventana,
si toco
junto al fuego
la impalpable ceniza
o el arrugado cuerpo de la leña,
todo me lleva a ti,
como si todo lo que existe,
aromas, luz, metales,
fueran pequeños barcos que navegan
hacia las islas tuyas que me aguardan."
[Pablo Neruda]


-> Continuação do projeto "Carta a ele". Dessa vez agraciado com um trecho do poema "Se tú me olvidas" de Pablo Neruda.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Textofonia 5: Trajetória de uma canção

Sou um. Somos muitos. Invisíveis. Perturbadores. O futuro. Sou agora. Aqui. Somos sempre. Em qualquer lugar.

A canção que faz ritmo ao meu coração pode tocar em muitos outros semelhantes, quiçá em todos. Hora ou outra é possível que duvide de um verso, que tire um advérbio de negação, que altere o gênero do ser amado, que inverta a posição dos jogadores, que a troca de uma palavra faça maior sentido... Quando o sol não entra pela janela provavelmente segura as cordas, se desfaz das baquetas ou tampa as teclas.
Quando a melodia não fizer mais sentido rasgue as partituras, as fotos, as poesias que compôs, ou as esqueça numa gaveta. Tanto faz. Quando descobrir novos acordes, toque outra música. Inove, invente, imite. Transmita a mensagem que achar melhor, desde que a possa sentir.
Se perder o público - a banda, o ritmo ou a letra - lembre-se de que a canção é sua. Que você pode escrever o que quiser. Que se ninguém mais sentir, você ainda poderá sentir. Não importa se os demais só ouvem uma bonita canção, é seu coração quem precisa ser acolhido. Não estranhe se ninguém tiver a mesma sensação, uma música não tem explicação.
Se falar da sombra das árvores sendo outono... Se agradecer o sol enquanto chove... Se citar os pinheiros enfeitados em maio... Chamar-te-ão louco. Seja um louco feliz! A sanidade dos outros está em sobreviver à escolha do comum, optar pelo mais fácil quando poderia preferir o mais valioso. O que era enfermidade hoje é a cura. Na Casa Verde só permanece o doutor, lembra?
Ninguém agrada a todos, nem mesmo sua honesta canção. Assim como eu, assim como todos os demais, temos fases em que somos os preferidos, e outras em que somos excluídos. Importe-se em cantar de coração. Mesmo que desista no caminho. Se for ao chão, não tema, estenda a mão. Escrevemos juntos o resto.

Ana Kita


-> Embora a inspiração tenha vindo de "O Exército De Um Homem Só " - Engenheiros do Hawaii, peço perdão por usar palavras que podem ser vistas tão idealistas de jeito tão subjetivo. É apenas uma das visões que podemos ter perante essa poética música.

Obs.: "Na Casa Verde só permanece o doutor" é uma referência ao conto "O Alienista" de Machado de Assis.

Textofonia 4: Correntes ao acaso

"Não peça perdão, a culpa não é sua. Estamos no mesmo barco, e ele ainda flutua." Humberto Gessinger
Queria dizer tanta coisa e não sei como, e nem sei a quem, e nem penso que adiantaria, e nem acredito que alguém ouviria. Deixo correntes ao acaso me levarem, temo.
Às vezes penso que as pessoas são como eu, e por isso podem me entender. Chego a pensar que sentem o mesmo. Sei que é um equívoco, ingenuidade.
Quando dou por mim já tenho um sentimento, uma nova ilusão, tanta motivação, tanta esperança. Demora, algumas vezes mais, outras nem tanto. Logo descubro que as pessoas costumam ser muito diferentes de mim. Percebo que não sabem o que sinto, não entendem o que digo... Duvido que sintam o mesmo que eu. Ainda assim, continuam juntas a mim. Talvez seja um teste do destino, um duro exercício de aprendizagem, ou - como é comum me passar na cabeça - elas também sintam e tenham tantas dúvidas quanto eu.
Se existe uma grande diferença entre os outros e eu é essa minha necessidade de procurar palavras para codificar o que sinto. Um dom, talvez. Um castigo, quem sabe. Há quem ache uma recompensa, ao acaso. A realidade é que "julgamos" os outros por nós. Querendo ou não procuramos os mesmos sentimentos e atitudes. E quando me vejo sozinha, sem ninguém que queira ou possa codificar o que sente e o diga a mim (quem dera sentisse por mim), começo a me perder. A falta de palavras são como correntes que me prendem... me levam... extinguem.
Quando leio uma palavra que reflita o que sinto apego-me a ela desta tal forma desastrosa. É provável que seja este meu maior defeito. Fico cega ao contexto, ao autor e suas características além da palavra. Que culpa eu tenho? Minha melhor chance de melhorar é conhecer minhas falhas. Neste momento, transformo meu conhecimento em algo palpável e resistente (esta é a razão de escrever tanto do que sinto) quem sabe assim - talvez só assim - esteja eu mais perto de consertá-las. No mínimo aprendo a lidar com elas.
Peço perdão. Peço perdão por todos os momentos em que falhei, pelos momentos que fiz alguém se sentir falho. Perdão pelos momentos em que não consegui ser luz, pelos caminhos cruéis que passei, por alguém que por ventura levei comigo. Peço perdão em especial por tentar ser sua amiga e nem sempre conseguir. Se continuamos no mesmo barco e se ele continuar a navegar: ajude-me. O sol não tem me banhado, mas a lua sempre aparece. Dê-me mais uma chance, ou quantas puder me dar.
Não prometo acertar sempre, nem poderia. Não prometo que não terei medo de falhar ou de seguir a tudo que me guiar. Tudo que posso garantir é que estou disposta a tentar. Estou pedindo (talvez um tanto calada) sua ajuda, ensine-me e verá meu esforço para aprender. Mostre-me seu caminho, sinto que posso segui-lo. - Talvez meu coração já esteja contigo.

Ana Kita

-> A partir da canção "Mapas ao acaso" - Engenheiros do Hawaii. Citação do início pertence a mesma.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Textofonia 3: Entender não é preciso

Ele não entende. E por mais que eu tente, eu não consigo entender a sua dificuldade. Tudo isso está me enlouquecendo.
Quando eu acordo, lavo meu rosto e de repente me pego falando sozinha: "Não está em meus olhos? Neste sorriso constante? No brilho da minha pele?" À noite, quase não durmo pensando. No banho estou cantando. Quando tenho a manhã livre admiro as crianças brincando no parquinho. Queria encontrar numa cena de filme, ou na ingenuidade infantil qualquer maneira de fazê-lo entender.
Estava ouvindo o rádio antes de ir encontrá-lo, tinha decidido usar uma música da sua banda preferida. Nos encontramos na praça, quase não tinha sol, e então eu percebi. Não tinha mais importância se ele entendia ou não.
Meu coração acelera toda vez que eu o vejo, minhas mãos não sabem o que fazer, minhas palavras saem bobas, meus olhos brilham, mordo meus lábios. Eu vejo seu rosto iluminado, desejo suas mãos, suas palavras, seu olhar, seus lábios, seu coração... Não importa mais nada quando estou com ele. Eu o amo. Se ele não puder sentir, entender, retribuir... Não fará diferença. Creio que ele entende, embora não saiba. Sinto que seu coração acelera harmônico ao meu. Suas mãos ficam quentes, e volta e meia tentam me tocar. Quando nossos olhares se encontram ele costuma sorrir, algumas vezes fica rubro. Já conseguimos nos entender mesmo sem palavras, só é preciso um olhar ou um gesto e sabemos o que outro deseja. Continuamos discutindo, e não acho ruim. Parece que ele também gosta. Opiniões que divergem junto a corações que se unem.
Sinto que ele começa a entender toda vez que entra em meus olhos. Mais que isso, percebo que confessa sentir.

Ana Kita

-> Auxílio sonoro da canção "Pra entender" - Engenheiros do Hawaii.

Poema: Seja luz - Ana Kita

SEJA LUZ
Ana Kita

Se é manhã de Sol, ilumine.
Se é tarde com nuvens, ilumine.
Se é noite chuvosa, ilumine.

Na primavera, brilhe nas flores.
No verão, brilhe nas águas.
No outono, brilhe nas folhas.
No inverno, brilhe nas pessoas.

Quando o amor prevalecer, irradie.
Quando só parecer solidão, irradie.
Quando puder fazer festa, irradie.
Quando as enfermidades aparecerem, irradie.
Enquanto houver fé, seja luz.


-> Poema, com pequenas alterações, feito (em 6 de maio de 2010) no Curso Persona, orientado através da mensagem "Qual seu verso?" do filme "Sociedade dos Poetas Mortos".

Ideias que despertam o riso, ou não.

Para quem - assim como eu - não vê na autora dessa blog muito senso de humor.

A ironia sabe-se que a blogueira usa com frequência, mas a piada por si só (que pode transmitir uma mensagem com a qual ela não concorda) costuma ignorar.

Ideias humorísticas (talvez para mulheres):
  • Os homens, para a própria sorte, nunca entenderão as mulheres. Infelizes aqueles que tentam.
  • Frequentemente às sextas à noite sinto falta de um namorado. Aos sábados percebo que tenho menos de uma semana para comprar um vibrador.
  • Sinto falta de homens quando começo a passar muito tempo em casa. Faltam-me encanador, eletricista, técnico em informática...
  • A nova namorada "dele" é muito interessante, vou confessar. O cabelo é assustador, vive cometendo erros gramaticais no orkut, nunca vi alguém tão presunçosa, e do mau gosto prefiro nem comentar.
  • Não é que os homens sejam lentos para compreender, eles não tentam.
  • Não concordo que os homens pensem com seu órgão sexual. O "amiguinho" do meu ex jamais me trocaria.
  • Os homens são eternas crianças. Elogie-os mesmo quando o desempenho não for o esperado. Faça-lhes um agrado esporadicamente, ainda mais esporadicamente pode conseguir uma recompensa. Tirar o brinquedo deles pode ser fatal. Às quartas e aos domingos eles têm seu tempo de diversão. Frequentemente às quintas e segundas eles poderão estar com o ânimo explosivo, tenha paciência. Não os contrarie, especialmente nos assuntos que eles consideram importantes. Lembre-se que as crianças são ingênuas quanto aos defeitos de suas mães. Muitas lições exigem repetição para que absorvam, repita.
  • "Hoje vi a desgraça humana. Trágico. As pessoas acham graça."

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Carta a ele 2: Compreensível metáfora

Num lugar qualquer, um dia qualquer. Que diferença faria?

A um qualquer (qualquer um que não queira entender),

o sol se pôs há muito tempo. Já é noite, normal ser assim? Para mim, talvez para você. Sei que muitos estão radiantes, talvez até eu os inveje, fico feliz por eles. Lamento pela ignorância deles. Todos eles ignoram ou fingem muito bem que falte sol. Hipocrisia! Parece óbvio que eles também já sentiram a ausência do sol. Não?
Estou metafórica demais para que você me compreenda? Não me responda. É provável. Compreender implica uma série de fatores que são conflituosos demais para eu e você. Que fatores não são? Perdoe-me tão logo possa.
As poesias que lhe fiz, hoje não passam de palavras perdidas num papel. Outros podem ainda senti-las, mas não fazem a nós qualquer sentido. Tudo já perdeu o sentido? Se foi perda de sentido o que faço lhe escrevendo? Melhor que me calasse. Também eu não deveria sentir.
Pobres espectadores ébrios - mais pobres seriam os sóbrios!? -, nada sabem de mim, de você (tampouco eu), do que sinto, do que sente (por sinal, você sente alguma coisa?), do que nos envolve (há mais que essas cartas!?).
Não tenho responsabilidade nenhuma, apenas escrevo a você.
Escrevo sem saber por quê. Escrevo sem entender o quê. Escrevo sem esperar retorno, sem pretensão de compreender, proibida de umedecer palavras. Escreva-me tão logo queira!

Com todo meu carinho, sempre sua Ana.


->Continuação do meu projeto "Carta a ele".

Textofonia 2: Sábio amor passado

Fechos meus olhos e assisto ao nosso passado, cada carta, cada palavra, cada gesto, cada sorriso... Ele sabia me conquistar do tom da sua voz até o último beijo. Seu personagem, hoje distante, recorda-me mais um "mestre" da sedução que o par romântico da protagonista. Como ele veria minhas recordações? Penso que não lhe faria diferença alguma, e dói. Seu silêncio me machuca há muito tempo. Suas palavras nunca vão chegar, se é que elas existem.

Ainda me surpreendo com a insensibilidade humana.
Humano, ao meu ver, era justamente ter as capacidades sensíveis. Viver em sociedade, precisando, desejando o bem comum. Sentir a necessidade de se alimentar, mas ao ver um semelhante tão faminto ou mais, dividir o mínimo que se tem. Saber de lugares quase perfeitos para se viver e ainda assim tentar transformar onde se vive, em alguns casos, até ir a lugares quase impossíveis de se viver para ajudar aqueles que lá sobrevivem. Ter milhares de motivos para chorar, e tentar sorrir para ajudar um semelhante que chora. TER SENTIMENTOS! Os cientistas falam das capacidades de planejar, de se comunicar num código tão desenvolvido, de guardar... Eu pensava além, ser um humano me soava ser capaz de amar, de cuidar, de desejar, de ajudar, de sofrer, de entender, de perdoar.
Agora bate uma dúvida. (...) Melhor não compartilhar minhas ideias, são tão instáveis e adaptáveis. Penso que ainda acredito nesse ser humano completo, embora eu viva com muitos seres humanos aparentemente desprovidos de qualquer sensibilidade.

Ele sabia tanto, podia me ensinar tanto sobre mim mesma. Parecia adivinhar meus pensamentos só de me olhar, parecia compreender meus movimentos mesmo quando não os via. Eu ficava o admirando, calada. Tudo que eu pensava dizer me parecia pouco, incapaz de transpor em palavras tudo o que eu sentia. Ele parecia capaz de decifrar meu silêncio.
Eu nunca soube. Ainda quando eu implorava que me dissesse o que pensava, eu nunca conseguia acompanhar o que sentia. Quando ele decidiu - e apenas me comunicou - que só o que me daria seria seu silêncio, confesso, pensei que a razão de eu desconhecer os sentimentos dele fosse por ele não os ter.
Hoje não penso assim. O pouco que sei do conteúdo das cartas que ele poderia me enviar me faz crer que ele só não sentia nada em relação a mim.
Hoje ele sente muito por outra pessoa. Talvez seja o sol que hoje iluminou as ruas, mas nesse momento eu não vejo isso como algo tão ruim. Não posso julgar que eu não merecia os sentimentos dele, que a culpa foi minha, que fiz algo errado, ou que nunca terei alguém que sinta por mim o que eu senti por ele; as razões sentimentais vão além dessas regras comuns. Era para ser assim. E foi. Ele sabia, sabia inclusive que eu não conseguiria.

Ana Kita

-> Estímulo sonoro de: "Às vezes nunca" - Engenheiros do Hawaii (1992)

terça-feira, 4 de maio de 2010

Carta a ele 1: Palavras que unem nossas mãos

Joinville, 4 de maio de 2010.

Quem sabe esteja eu apenas num dia de nostalgia, aquela velha mania de sala de aula de escrever uma carta. Data completa, destinatário como vocativo - esta parte eu pulei, talvez não haja alguém -, um texto cheio de pessoalidade e algum objetivo!?, uma despedida, uma assinatura. Algo mais? Veremos, ou não.
Qualquer um que me conhece sabe o quanto sou inconstante, extremamente "caxias" e, a seguir, tudo em desordem. Esta carta é assim, mais orgânica que estruturada, mais emoção que objetivada na razão. Pare de ler se me achar incoerente, melhor que o faça. Neste instante faço uma pausa e entendo. Entendo a magia de que minha mãe me dizia quanto às cartas. Adoro a digitação e esse vasto mundo virtual, mas algo me falta. Talvez seja meu conhecimento débil que me engana, porém agora, senti falta de lhe mostrar o que sinto com a expressão da grafia... Quem sabe um ponto no "i" com mais tinta, um coração ao errar o lugar de um acento, a palavra "coração" escrita trêmula.
Queria que nossas mãos distantes pudessem se encontrar numa folha de papel. Meu toque afetuoso, meu perfume doce, poderiam em fim aproximar-se de suas mãos quentes, de seu quarto iluminado... Até o dia da frigidez de uma lixeira. Não julgue-me como cruel, embora eu concorde com Belchior, "sons, palavras, são navalhas e eu não posso cantar como convém, sem querer ferir ninguém", não é exatamente esta a minha intenção. Eu só digo o que sinto ou prevejo. Nesses casos sabemos que o fim é inevitável, e só peço que os sentimentos ruins sejam apaziguados.
Estou feliz hoje, ainda que os raios de sol não me banhem. Ontem não foi um dia fácil, e incrivelmente foi um dia bom. A serenidade do meu coração não pertence às coisas difíceis, e sim, à capacidade de lidar com elas. Acredito que as maiores dádivas acontecem nas formas simples de felicidade sincera - o nascer do sol, um beijo, o desabrochar de uma flor, a gota do orvalho nos primeiros raios da manhã, o arrepio, a brisa noturna, o toque das mãos - e nem por isso, deixo de pensar que eu posso encontrar razões a sorrir mesmo em nossos desentendimentos.
Escreva-me tão logo queira!

Com todo meu carinho, sua Ana.


-> Este é mais um novo projeto para o blog. "Carta a ele" será mais uma forma de expressar o que sinto, ainda mais pessoal que outros textos, e quem sabe tão literário quanto os demais.

domingo, 2 de maio de 2010

Textofonia 1: Encontremos Sintonia

Você tem meu número, por que não liga? Você disse que ligaria. Você dizia que me amava. Passam-se as horas e já é tarde para eu continuar acordada. Tarde para você me ligar, talvez esteja com seus amigos ou dormindo, como todos deveriam. Mas, tudo que penso, é o quanto éramos perfeitos. Perfeito não é utopia? - você me diria. Confesso que eu concordaria, embora dissesse algo que lhe contrariasse. Com você e eu é sempre assim, precisamos discordar com as palavras para que os corações entrem em sintonia.
Volta comigo para o nosso lugar? Voltemos àquele tempo em que estava tudo bem. Em que nos apaixonávamos pelos erros do outro, suportávamos as diferenças e planejávamos pelas semelhanças. Perdoe o que nos afastou, esquece o que não mudou, cancela seus programas para hoje e fica só comigo. Fica bem perto, ouve meu coração, ele ainda chama seu nome. Era um tempo tão bom, não posso acreditar que você esqueceu tudo que vivemos, tudo que sentíamos. Queríamos tanto.
Preciso dormir, preciso dormir agora. Só me acorde quando tudo isso acabar e você voltar.

Ana Kita

->Música utilizada: "Perfeita simetria" - Engenheiros do Hawaii