quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Ilusões - Ana Kita

   Numa outra noite, ela estava sentada no meio fio. A cabeça distante, viajando ora pelo tempo, ora pelo espaço. Não conseguia pousar em lugar nenhum, tampouco segurar as lágrimas. Sentia-se sozinha, abandonada. Embora soubesse que podia fazer algo para que fosse diferente, continuava ali, sentada, sofrendo. Por um instante ansiou por um abraço, no momento seguinte preferia ir à praia, depois sentiu o corpo cansado e desejou poder dormir por um dia inteiro.
   Deitou-se na calçada a fim de procurar uma estrela que a distraísse. O céu cinzento não a fez mais melancólica do que já estava. Tentou se enganar que tudo era uma questão de cansaço, que havia trabalhado muito, que já era tarde e devia se permitir o aconchego da cama. Entreteu-se observando um inseto que voava sobre a luz do poste e refletiu que o quarto lhe traria mais solidão.
   Sentiu um arrepio, talvez fosse medo, talvez uma ideia estúpida. Quis crer que tinha sido a brisa noturna. Juntou suas forças para se erguer. Parecia tonta, como se a tristeza a embriagasse. Antes fosse um bêbado dormindo na calçada do que uma mulher apaixonada. A embriaguez passa na manhã seguinte, a dor de cabeça não dura mais que doze horas, às vezes vomita o que lhe faz mal e já é uma nova pessoa. Com ela seria diferente.
   Deu um passo na direção contrária, uma boba esperança de que alguém lhe abrigasse. Era tarde, ninguém poderia ajudá-la. Seguiu o caminho de casa. Jogou-se no sofá depois de abrir as janelas e as cortinas. Desejava que o vento tivesse o poder de levar tudo, todo o mal, a dor, aquela solidão que a corroía... Levasse também a paixão, as lembranças, aquela maldita esperança de que até a noite cair novamente, ela seria amada. Julgava-se burra, como se merecesse sofrer por não ter aprendido. Já tivera tantos homens, já sofrera tanto, não entendia porque ainda se entregava desse jeito. Por que sempre achava que seria diferente? São todos iguais, ela também não mudou muito. Ganhava um dia a mais, um passeio diferente, mas terminava sempre do mesmo jeito. Caía sempre na mesma armadilha de acreditar, de se envolver. Quase amanhecia, então ela pensava que lhe faltava amor próprio. Que assim que se apaixonava por um novo homem, esquecia de si. Ficava submissa aquele sentimento, lutava tanto para que a relação desse certo que nada mais importava, cegava-se a queda de interesse dele por ela e... Por fim sofria sozinha.
   (...)
   Adormeceu com os primeiros raios de sol, pensando que talvez amanhã fosse diferente. Ele podia ter um motivo para ter sumido, podia estar tão envolvido quanto ela e quando se vissem o amor transbordaria. Sonhou com pétalas e música, numa perfeita noite de amor.

Ana Kita

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