quinta-feira, 20 de maio de 2010

Amor, sigo tuas pistas - Ana Kita

Cássio sozinho na casa do amigo questionava-se de onde viera a ideia de presentear professores com maças. Por que não uma laranja? Ele iria gostar mais. Ainda assim não fazia sentido, não conseguia se imaginar presenteando alguém com uma fruta. Quem dirá um professor com o fruto proibido. Ria sozinho de suas ideias. Não sabia como partiu para aquela viagem, embora o filme ao qual assistia, Encontrando Forrester, estivesse ambientado numa escola, não mencionava qualquer ideia sobre maçãs.
Quando o filme acabou , deitou-se no primeiro quarto que encontrou, pertencesse a quem fosse. Havia um rádio relógio no criado-mudo, apaixonado por música ligou sem se importar com a rádio sintonizada. Assuntou-se ao ouvir o radialista anunciando “mais um bolero para aquecer seu coração”. Quem ouvia uma rádio assim? O que mais lhe surpreendeu foi reconhecer o refrão do bolero. Demorou a descobrir onde já ouvira. Num pagode? Sim, aquela ideia do filme era real, estamos sempre nos apropriando do que conhecemos, transformando e tomando posse. Cássio quase perdeu o raciocínio encantado com o perfume do travesseiro. A quem pertencia? Tentando retornar à ideia, proferiu algo que já parecia ter lido: “No mundo artístico você precisa mais do que criatividade, é fundamental ter bagagem.”
A canção terminou, e a porta se abriu. Um grito feminino. Cássio pulou da cama tentando explicar que era hóspede da família. Laura não queria ouvir nada. A cueca azul do rapaz a deixara histérica demais para que pudesse compreender qualquer coisa que ele dissesse. Cássio se vestia apressado. Falava milhares de coisas desconexas que nem ele sabia o que estava dizendo. Demorou alguns boleros para que se acalmassem. Com um pouco de conversa entenderam a confusão.
Laura havia voltado de viagem naquele dia, por isso não sabia da presença do amigo do irmão. Para dois estranhos que a pouco gritavam a conversa se desenvolveu muito bem. Descobriram a mesma preferência de filmes. Além do DVD dela que ele acabara de assistir, o predileto de ambos era Escritores da Liberdade. Ele ficara encantando com as experiências dela, a última praia que ela visitara parecia surreal em suas descrições. Para ser sincero, Cássio achava tudo que a garota lhe dizia como passagens de um livro poético.
A moreninha era suave e adorável, tinham tanto em comum, e era tão linda. Enquanto ele delirava no movimento dos lábios dela, ela repetia pela terceira vez a mesma pergunta: “O Felipe, onde está?” Cássio caiu em si. Embora fosse trabalhoso desviar os olhos do top amarelo que a garota vestia, conseguiu responder. “Ele foi produzir o Efeito Borboleta” – brincou. Queria dizer alugar o DVD, porém a locadora era na esquina e o amigo havia saído a mais de uma hora. Ambos conheciam Felipe muito bem. Sabiam que ele teria parado para conversar com alguma conhecida e perdido a noção do tempo. Se é que ele a possuía.
No rádio começou a tocar Infinita Highway, ambos cantaram. “Nossa, você também gosta de Engenheiros?” – questionou Cássio sorrindo. Parecia brincadeira, Laura era fã de carteirinha desde criança. Aprendera a tocar violão só para tentar tocar canções da banda. Cássio se sentia apaixonado, justamente ele, tão cético e questionador, de repente sentia tanto do que nunca acreditara. Estaria acreditando em “amor à primeira vista”? Ele segurou a mão dela, ela se aproximou. Tentou beijá-la, ela colocou a mão nos lábios dele. “Uma última pergunta - tudo isso não parece real. Seu livro favorito?” Ele deveria responder honestamente alguma ficção com temática política, mas sobre a escrivaninha podia ver um clássico. Acertou em cheio: “Dom Casmurro”. Ela o beijou.

Ana Kita

-> Conto produzido sobre a orientação do professor Pablo Pereira, no Curso Persona.
-> Imagem do filme Efeito Borboleta.

2 comentários:

  1. êita que tuas referências são boas por demais!

    adoro textos assim, que contemplam filmes, livros, músicas.

    dá-lhe produzir, hein, menina?! =D

    beijo!

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  2. Obrigada! :D
    Todo texto precisa de "bagagem". Algumas são mais valiosas se evidenciadas. Quando há orientação sempre aparece algumas interessantes, outras um tanto "forçadas". Na espontaneidade acabo me esquecendo de marcar algumas.

    Produzir é preciso! haha

    Beijo!

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